Mansfield Park
Autora: Jane Austen
Editora: Martin Claret
303 páginas
*Edição especial que reúne três romances da autora: ‘Mansfield Park’, ‘Emma' e ‘A Abadia de Northanger’.
*Edição especial que reúne três romances da autora: ‘Mansfield Park’, ‘Emma' e ‘A Abadia de Northanger’.
O terceiro romance de Jane Austen retrata a história
de Fanny Price, uma jovem que vem de uma família pobre, e que aos 10 anos passa
a morar e ser educada pelos seus tios ricos, cuja propriedade é Mansfield Park.
As duas tias de Fanny vivem muito bem, Lady Bertram teve um ótimo casamento com
o baronete Thomas Bertram, e a Srª. Norris se casou com um clérigo e vive no
presbitério de Mansfield Park, garantindo uma vida confortável. Entretanto sua
mãe, a Srª. Price, não teve tanta sorte, se casou com um tenente sem educação,
fortuna ou ligações, teve nove filhos, e não possui muitas condições de
sustentar sua família.
Com uma forma de ajudar a irmã mais nova e diminuir
suas despesas, a Srª. Norris propõe levar a filha mais velha para Mansfield,
para dar-lhe alguma educação, entretanto quem iria cuidar dela seria a família
Bertram. Sir. Thomas e Lady Bertram têm quatro filhos, dois rapazes e duas
moças, e Fanny teria a mesma educação e cuidados que suas filhas, porém sempre
deveria ser lembrada sobre seu verdadeiro lugar e posição.
“[...] não há no mundo tantos homens ricos quanto mulheres bonitas que os mereçam.”
“[...] não há no mundo tantos homens ricos quanto mulheres bonitas que os mereçam.”
Fanny cresce em Mansfield e se torna uma jovem
atenciosa, meiga, tímida e muito observadora. Aprecia poesia, ama contemplar a
natureza e possui um bom senso moral. Na verdade, a protagonista do romance, em
grande parte da história é mais espectadora do que participante. Na maior parte
do tempo, a autora apresenta o que acontece ao redor de Fanny e retrata os sentimentos
dela perante as situações que enfrenta e observa. As primas de Fanny, Julia e
Maria, são insuportáveis; a tia Norris pior ainda; Lady Bertram é descontraída,
mas depende de Fanny para tudo; Sir. Thomas a trata com indiferença; o primo
mais velho, Tom, não pensa muito na família e quase não para em casa; já o
primo Edmund é o único que conversa realmente com Fanny, e chegam até mesmo a trocar confidências. Ele é
seu verdadeiro amigo e secretamente seu verdadeiro amor.
“Aqui se vê harmonia! Aqui se repousa! O que se aprecia nessa
paisagem supera tudo o que a pintura e a música são capazes de expressar, e que
só a poesia pode tentar descrever! Eis o que pode tranquilizar qualquer
preocupação e arrebatar o coração! Quando vejo uma noite linda como esta, sinto
como se fosse impossível existir maldade e sofrimento no mundo. Decerto haveria
menos das duas coisas se as pessoas apreciassem a perfeição da natureza e se
motivassem mais a sair de si mesmas para contemplar um cenário como este.”
Grande parte da história de Fanny gira em torno desse
amor secreto, o leitor acompanha todas
suas alegrias, tristezas e aflições, principalmente com a chegada dos irmãos
Crawford, Mary e Henry, para Mansfield Park. Edmund fica encantado por Mary, que é
uma jovem muito bela e inteligente, mas ao mesmo tempo muito cruel e
interesseira em suas opiniões e ambições. Fanny é uma personagem que assiste
tudo calada, vive com suas próprias reflexões e diz somente o necessário. É uma
protagonista que compreende seu destino, e apesar, de certos momentos se impor,
ela aceita o que está por vir, mesmo que se chateie ou fique triste, em alguns
momentos se condena por amar o primo e sabe que é errado, perante sua situação,
mas ao mesmo tempo deseja que ele estivesse apaixonado por uma pessoa com uma índole
melhor, pois seria menos doloroso para ela perder seu grande amor pra uma
pessoa que realmente fosse boa para ele.
"[...] neste momento me sinto fanfarrão o bastante para interpretar qualquer papel já escrito, desde Shylock ou Ricardo III até o herói trovador de uma farsa, com capa escarlate e tricórnio. Sinto como se pudesse ser qualquer coisa ou tudo, arengar ou esbravejar, golpear ou dar cambalhotas em qualquer tragédia ou comédia da língua inglesa. Vamos fazer alguma coisa. Que seja apenas a metade de uma peça, um ato, uma única cena, o que nos impede?"
Nesse romance, Jane Austen, apresenta as diferenças
sociais de forma bem acentuada, a forma que Fanny é tratada perante seus
primos, a diferença de vida em Mansfield Park comparada a humilde e barulhenta casa da Sra
Price, são diferenças gritantes. As conversas entre os nobres, são repletas de
educação e decoro, que na verdade são verdadeiras máscaras para as inúmeras alfinetadas
e ironias que surgem em meio aos diálogos- e afirmo que as conversas entre os
nobres deste livros, em certos momentos, são um tanto cansativas e tediosas. Todavia,
mais uma vez a autora preenche seus textos com sátira a sociedade e questiona
valores, como tradição, fidelidade e status social.
“[...] não há um em cada cem homens ou cem mulheres que não seja enganado quando se casa. Não importa onde observe, vejo que é assim, e acho que deve ser assim, quando penso que, de todas as transações é a única em que as pessoas esperam mais das outras e são elas mesmas menos honestas.
-Ah, você esteve em uma má escola de casamento, na Hill Street.
-Minha pobre tia sem dúvida teve pouco motivo para gostar dessa condição, mas, no entanto, segundo minha própria condição, trata-se de uma questão de manobra. Conheço muita gente que se casou com toda expectativa e confiança numa determinada vantagem, ou realização, ou boa qualidade na pessoa, mas depois se viu em tudo decepcionada e foi obrigada a enfrentar o exato oposto. O que pode ser isso, senão se enganar?”
A narração do romance acontece de diversas maneiras,
em certos momentos em primeira pessoa, a própria autora levanta algumas
questões, e em outros momentos em terceira pessoa apresentando tanto os
sentimentos e situações que a protagonista se encontra, como também de outros
personagens e acontecimentos da trama. Segundo a professora britânica Kathryn
Sutherland, há uma consciência fictícia central, que é geralmente da heroína, que
é absorvida pela voz da narradora onisciente, que é uma fusão de narrativas em
primeira e terceira pessoas, que os críticos chamam de “discurso indireto e
livre”. No entanto, ela completa que , “os pensamentos de uma potencial
narradora na primeira pessoa se impõem à voz narrativa exterior”. Há
convergências e divergências entre as vozes das narrativas onisciente e
subjetiva, e apesar de se identificarem com frequência, a voz da narração
onisciente também se contradiz em muitas interpretações subjetivas.
Mansfield Park é apontado como a obra mais complexa, profunda e a mais difícil de se gostar. Críticos e leitores ficam intrigados com Fanny Price, segundo Kathryn Sutherland, o perfil psicológico da protagonista está em sintonia com debates que acontecem desde o final do século XVIII e início do século XIX, a respeito da relação entre a natureza e o condicionamento social nas mulheres, -o que atualmente refere-se ao debate de sexo e gênero-,e os limites aceitáveis da conduta feminina em termos de autoexpressão e autocontrole.
Na verdade, eu esperava mais de Fanny, pois é um
personagem que vai crescendo na trama, portanto esperava que ela tivesse mais
atitudes. Entretanto, mesmo que a trama seja lenta e em alguns momentos até
monótona, a vida da protagonista passa por diversas reviravoltas, o leitor acaba por se envolver com a história
de Fanny e há uma enorme curiosidade em saber qual será seu destino. Esse é um
dos pontos que mais amo em Jane Austen, você fica aflito com a situação da
protagonista e anseia por mais. Porém, apesar do final ter me surpreendido,
gostaria que fosse melhor desenvolvido. É definitivamente uma obra espetacular,
complexa e intrigante.
“Se é possível considerar uma das faculdades de nossa natureza mais admirável que as outras, eu acho que deve ser a memória. [...] A memória, às vezes, conserva tantas coisas, é tão útil, tão obediente, em outras vezes, tão confusa, tão fraca, e, em outras ainda, tão tirânica, tão fora do controle! Somos, sem dúvida, um milagre em todos os aspectos, mas as nossas capacidades de lembrar e esquecer parecem estranhamente insondáveis.”
“Se é possível considerar uma das faculdades de nossa natureza mais admirável que as outras, eu acho que deve ser a memória. [...] A memória, às vezes, conserva tantas coisas, é tão útil, tão obediente, em outras vezes, tão confusa, tão fraca, e, em outras ainda, tão tirânica, tão fora do controle! Somos, sem dúvida, um milagre em todos os aspectos, mas as nossas capacidades de lembrar e esquecer parecem estranhamente insondáveis.”
Assim como outras obras da autora, há várias adaptações
dessa trama para tv, cinema e peças de teatro. Inclusive o filme de 2007 tem
como protagonista a atriz Billie Piper, que também interpretou Rose Tyler na
série "Doctor Who" e atualmente está na série "Penny Dreadful" ( caso não conheça
essa série, veja AQUI a resenha) interpretando a personagem Lily Frankenstein.
As fotos presentes na resenha é da edição especial, da Martin Claret, que contêm
três títulos da autora: Mansfield Park, Emma e A Abadia de Northanger. Há também
uma outra edição com capa rosa, da mesma editora, com outros três títulos:
Orgulho e Preconceito, Razão e Sensibilidade e Persuasão, que você pode conferir clicando AQUI. Essas edições da Martin Claret são maravilhosas! Pra quem gosta e aprecia a escrita da
autora e curte colecionar as obras, vale a pena adquirir. Há também lindas ilustrações originais, do
século XVIII, do ilustrador Hugh Thompson.
Eloise G.F
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